sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Resposta a Carta enviada para o deputado Marco Feliciano pela psicóloga Marisa Lobo

Surpreso, li hoje o texto da colega Marisa Lobo, que se autodenomina psicóloga cristã. Achei um discurso bem interessante do ponto de vista antropológico e também crítico; um discurso extremamente preconceituoso e justificante, se pensarmos socialmente e em uma esfera ampliada. Tal psicóloga fez uma carta de repúdio ao deputado Marco Feliciano, acusando o Conselho Federal de Psicologia de postura “antiética, amoral e isolada” ao participar de passeata defendendo o Kit anti homofobia do Ministério da Educação e Cultura, previsto para fazer parte dos apetrechos pedagógicos futuramente utilizados no ensino público (corrigindo a profissional que diz que o kit irá figurar no ensino de crianças; a previsão é para o Ensino Médio).

Podemos analisar o comportamento de tal pessoa como um reflexo do que acontece na sociedade e do que motivou tal kit a ser pensado. A profissional em questão explicita claramente o ódio sentido e as propensões pessoais envolvidas em seu discurso. Já podemos perceber pelo título utilizado em comparação às cores do arco íris utilizadas pelo CFP na passeata, considerando-se psicóloga CRISTÃ, a mesma, faz apologia a crenças, convicções, mas deixaremos de lado tais indagações, pois, como diz a própria psicóloga, “é vedado ao profissional de psicologia induzir à convicções filosóficas, religiosas, de orientação sexual”, tal profissional deve saber, tanto quanto eu o quanto tal denominação provoca em seus clientes e em tantas pessoas que vê associado a um título humano, assistencial e empático uma adjetivação de “cristã”, haja vista o quanto historicamente isso pode assinalar.

Pois bem, acho justo expor também minha visão, porém, tentando ser o menos possível pautado por minhas convicções pessoais e sim analisando historicamente, socialmente e refletindo sobre o que isso pode trazer.

Provavelmente não se deu atenção devida ao mesmo artigo e alínea do Código de Ética do Psicólogo que Marisa cita, já que finalizando a frase, vemos o cerne da questão, dizendo que o psicólogo “...NÃO PODE INDUZIR A QUALQUER TIPO DE PRECONCEITO”, fica claro que a “profissional” em questão utiliza-se de algo bastante difundido, infelizmente, no meio dos profissionais, sejam psi ou outras classes, que é a utilização tendenciosa e parcial tanto do código de ética, quanto dos conceitos apreendidos.

O CFP infringe o código de ética lutando pelo respeito à cidadania e à dignidade humana, quando defende um kit anti homofóbico (e não kit gay, como ficou conhecido pela bancada evangélica da câmara, termo difundido pela colega Marisa)? Mas a psicóloga em questão não vê infrações éticas quando se refere a homossexuais como pessoas com a libido sexual pervertida e problemáticos emocionalmente, além de insinuar serem promíscuos (quando associa o relacionamento homossexual a uma prática apenas para obtenção de prazer sexual)?

A única convicção a que somos levados é a de igualdade; de que a violência gratuita é prejudicial, é uma doença social, algo que deve ser banido. Lutar contra o fundamentalismo religioso, que prega a violência, o desrespeito, além de expurgar o pensamento “amplamente difundido no seio familiar”, como diz Marisa, de que o homossexual pertence ao gueto, deve ficar no escuro e silêncio, fazendo tantos jovens sentirem como desmerecedores de afeto e respeito atém mesmo por parte da família, transportando para o armário todas as pessoas diferentes, uma vez que o incômodo de lidar com o diverso desperta raiva, medo e reações preocupantes. Justamente nessa linha é que a defesa do kit anti homofobia se faz necessária, é lutando pela promoção da dignidade que o CFP honra seu vínculo social e humano, mostrando que o trabalho é pautado pelo respeito ao sujeito e seus direitos fundamentais.

Espero que, para chegar ao segundo artigo do Código de Ética a colega tenha passado pelos princípios fundamentais e verificado em seu inciso I que “O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos”. Ainda lido o inciso II “O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. Ainda podemos pensar no Art. 2 do Código de Ética, que a profissional se apega, onde foca a alínea b, sem se dar conta de que a alínea a, que, ao psicólogo veda o seguinte: “Praticar ou ser conivente com quaisquer atos que caracterizem negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade ou opressão”.

Acho de extrema importância que Marisa leia a carta do CFP que explica os motivos de aprovar o kit, que leia também a justificativa e se posicione para a realidade, procure saber as notícias chocantes de adolescentes espancados, de violência gratuita e até mesmo mortes, por uma simples discordância no que se refere a orientação sexual. Tal material não é feito para incentivar um ou outro tipo de comportamento sexual, mas para lutar contra o preconceito e essa animalesca violência de que temos notícias.

Portanto, deixo aberta minha decisão de não compartilhar da opinião de Marisa Lobo, que, indevidamente fala pelos profissionais psi, além de manifestar repúdio total à carta apresentada, lamentando que pessoas que deveriam ser um esteio e promover a luta pela ética, dignidade e igualdade assumam uma postura religiosa, pessoal; associando ainda o título de profissional psicóloga a determinações e crenças; defendendo, contrariamente ao mesmo código que a orienta, o preconceito, a visão pessoal, turva e o incentivo a atitudes homofóbicas e violentas.



Rafael Higino Wagner

Psicólogo CRP 06/98324

Link da Carta enviada por Marisa Lobo
http://www.guiame.com.br/v4/blog_marisa/145484-1857-Marisa-Lobo-questiona-C-F-P-sobre-passeata-em-apoio-ao-kit-gay.html